O volume de serviços prestados no país cresceu levemente acima do esperado em junho, mas a alta veio concentrada em um único setor, o de transportes. O desempenho contribuiu para um nível recorde do setor e para a alta dos serviços no segundo trimestre, após recuo nos primeiros três meses do ano, embora com perda de fôlego em junho. Mesmo que mostre contribuição positiva dos serviços para o PIB do segundo trimestre, o dado corrobora a esperada desaceleração no decorrer da segunda metade do ano, sob força da política monetária e incertezas vindas do cenário externo. Alguns economistas esperam, porém, continuidade de crescimento de serviços mais ligados à demanda das famílias, em razão de massa serial elevada e pagamento de precatórios no terceiro trimestre.
O volume de serviços prestados no país subiu 0,3% em junho, ante maio, com ajuste sazonal, segundo dados da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) divulgados nesta quinta-feira (14) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com isso, renovaram o patamar recorde da série histórica, iniciada em 2011. Com o desempenho de junho, os serviços estão em patamar 18% superior ao do pré-pandemia, em fevereiro de 2020. O dado de maio foi revisado para cima, de alta de 0,1% para 0,2%, na variação mensal.
A alta em junho foi maior que a mediana das estimativas de 23 consultorias e instituições financeiras ouvidas pelo VALOR DATA, de estabilidade. O intervalo das projeções ia de recuo de 0,5% a alta de 0,4% em junho. O resultado em 12 meses da PMS até junho é de aumento de 3%. No primeiro semestre de 2025, avançou 2,5% ante igual período de 2024.
“Apesar de o número ter vindo acima do esperado, quando olhamos a composição, o que veio mais forte foi a categoria de transportes. As outras categorias ficaram todas com variações negativas, apontando ainda para um processo de desaceleração”, diz Gustavo Rostelato, economista da Armor Capital.
A PMS mostra que o volume de transportes avançou 1,5% em junho, ante maio. Rodrigo Lobo, responsável pela PMS, destaca que o bom desempenho do grupo de transportes em junho pode ser atribuído tanto ao segmento de cargas quanto de passageiros. “O transporte rodoviário de carga inclui todo o deslocamento de mercadorias no país, sejam aquelas relacionadas ao agronegócio, como fertilizantes e os produtos em si, como bens industriais e de comércio. E esse aumento está intimamente ligado ao maior dinamismo da economia.”
A atividade de transportes, serviços auxiliares aos transportes e correio é a que tem o maior peso no setor de serviços, com participação de 36,4%. Os serviços de informação e comunicação, que são o segundo com maior representatividade, têm participação de 23,46%.
Apesar da alta em transportes, todas as demais quatro grandes categorias acompanhadas pelo IBGE recuaram. As atividades no grupo de outros serviços recuaram 1,3% e eliminaram quase todo o ganho de maio (1,5%). Os serviços prestados às famílias, por sua vez, registraram a terceira queda seguida, com recuo de 1,4%. Nesse período, a perda acumulada é de 1,8%. As demais atividades tiveram variações mais perto da estabilidade: informação e comunicação (-0,2%) e profissionais, administrativos e complementares (-0,1%).
Marianna Costa, economista-chefe da Mirae Asset, destaca a queda acentuada em serviços prestados às famílias, de 1,4% em junho ante o mês anterior, com ajuste sazonal. Em abril e maio houve recuo também, mas em variação menor, em 0,2% em cada um dos dois meses. Os serviços prestados às famílias, explica, é um termômetro para o setor de serviços como componente do PIB.
“A desaceleração é gradual, mas ela está acontecendo e isso vem de forma um pouco mais pronunciada agora”, diz Costa. O dado divulgado da PMS, diz, corrobora a expectativa para o segundo semestre de atividade estável em relação à primeira metade do ano, com crescimento zero do PIB, diz. Os indicadores de produção industrial e varejo, mesmo que com evoluções diversas, vão também nesse sentido, avalia.
Rodolpho Tobler, economista do Instituto Brasileiro de Economia da Fundção Getulio Vargas (FGV Ibre), também vê perda de fôlego no dado da PMS. “De fato, o resultado de junho é positivo, mas quando começamos a ter resultados muito concentrados em alguma atividade, percebemos que o setor passa a perder um pouco de força. O primeiro semestre termina de maneira positiva, com o setor de serviços ainda aquecido, mas já começando com sinais de desaceleração”, diz Tobler.
Para ele os preços mais favoráveis de passagens aéreas, em razão da desvalorização do real frente ao dólar, podem ter estimulado o transporte de passageiros acima do esperado. “Já o transporte de carga tem resquícios da supersafra de grãos, além de demanda ainda aquecida, com serviços de delivery ainda relativamente fortes.” O desempenho do setor de transportes, porém, não parece algo tão sustentável ao longo do ano, diz.
“Há uma desaceleração já esperada para o segundo semestre e a concentração do resultado dos serviços ao fim da primeira metade do ano já é um primeiro sinal disso”, diz. Para os próximos meses, Tobler espera oscilação das variações mensais da PMS em torno zero, com mais resultados negativos entre os grupos de serviços.
“A desaceleração vem, mas mais suave do que se poderia esperar com o patamar de juros que temos hoje. Não há como fugir dessa tendência de desaceleração, que vem suave porque o mercado de trabalho ainda contribui muito positivamente.”
Para Rodolfo Margato, economista da XP, o mercado de trabalho pode ainda ajudar a recuperação dos serviços prestados às famílias, apesar de a categoria ter decepcionado em junho e ter fechado o segundo trimestre com alta de 0,4% ante os três meses anteriores, bem aquém da variação de 1,1% do conjunto do setor de serviços em igual comparação. “Projetamos recuperação nos próximos meses, na esteira do mercado de trabalho aquecido, do volume elevado de transferências, como os precatórios previstos para o terceiro trimestre, e pela desaceleração da inflação de curto prazo.”
No geral, avalia Margato, o setor de serviços mantém expansão, embora em ritmo moderado. “Em nossa avaliação, os serviços mais ligados à demanda das famílias devem continuar em alta, enquanto aqueles mais vinculados à demanda empresarial tendem a perder tração na segunda metade do ano. O primeiro grupo será favorecido pela continuidade do crescimento da renda disponível às famílias, impulsionado pela elevação da massa salarial agregada e pelos gastos fiscais. O pagamento expressivo de precatórios no terceiro trimestre deve ter papel relevante nesse movimento.”
O acompanhamento feito pela XP com base nos dados disponíveis mostra crescimento do PIB no segundo trimestre de 0,2% contra os três meses anteriores, com ajuste sazonal. Há dois meses, destaca Margato, a projeção da corretora era de crescimento de 0,5%. Contudo, diz, o desempenho mais fraco que o esperado da indústria de transformação e do varejo, especialmente nas atividades mais sensíveis ao crédito, levou a revisões baixistas nas últimas semanas.
Para Leonardo Costa, economista do Asa, a alta registrada pelo setor de serviços no segundo trimestre do ano deve contribuir positivamente para o resultado do PIB em igual período, funcionando como um contrapeso em um cenário em que a maior parte das variáveis, como produção industrial e comércio, tem mostrado desaceleração recente.
Após os dados de comércio divulgados ontem pelo IBGE, diz Rostelato, da Armor Capital, já havia um viés negativo para para o PIB. A Pesquisa Mensal de Comércio (PMC) divulgada ontem mostrou queda de 0,1% no volume de vendas do varejo restrito em junho, frente a maio. No varejo ampliado, que inclui veículos, motos, partes e peças e material de construção, a queda foi de 2,5%.
Rostelato diz que ainda não tem a projeção fechada, mas estima que o crescimento do PIB no segundo trimestre deve ficar próximo de 0,1% ou 0,2% ante os três meses anteriores. “Em linhas gerais, tem uma cara de um PIB um pouco mais fraco. O crédito está desacelerando, há inadimplência um pouco mais elevada. Conseguimos ver alguns impactos mais claros da política monetária afetando a atividade econômica. Então acho que o PIB deve sofrer um pouco mais nesse segundo trimestre, embora não creio que a variação seja negativa.”
O economista estima que o PIB deve ter crescimento próximo de zero no terceiro e quarto trimestres de 2025, o que deve levar a uma alta de 2,2% em 2025.
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Fonte Agência Brasil