O advogado Hugo de Araújo Reis, de 42 anos, mora em Belo Horizonte (MG), mas viaja com frequência para São Paulo para ir à filial do escritório onde trabalha, perto da Avenida Faria Lima. Em 2020, ele começou a investir em imóveis de locação de curta duração na região, deixando de ser apenas um hóspede por ali. Desde então, comprou quatro apartamentos perto do escritório, sendo um em Pinheiros, um na Vila Madalena e outros dois na Vila Olímpia.
Quando tem reuniões em São Paulo, tenta bloquear a agenda de um deles para ficar hospedado, porém no restante do tempo os imóveis ficam disponíveis para locação em plataformas como o Airbnb ou Booking. Reis conta que o motivo da alta demanda de seus imóveis está ligado à pujante agenda cultural e corporativa da cidade. “A taxa de ocupação gira em torno de 80%, chegando a 90% em alguns casos. É uma boa perspectiva de rentabilidade e uma composição financeira relevante”, afirma.
O boom imobiliário da capital paulista atingiu o patamar recorde de 130 mil apartamentos lançados e 138 mil unidades vendidas nos últimos 12 meses, de acordo com dados da consultoria Brain Inteligência Estratégica. Com isso, as incorporadoras têm vendido seus apartamentos para consumidores não só de São Paulo, mas também de outras cidades, Estados e até países.
Na incorporadora Lucio, cerca de 30% dos clientes que compram seus projetos no Itaim Bibi são de fora de São Paulo. Esse é o caso visto no empreendimento Viscaya, que oferece plantas de 540 metros quadrados. O CEO da Lucio, Firmino Lucio Junior, conta que os compradores usam os imóveis como um ponto de apoio importante para fazer negócios na cidade. O preço médio do metro quadrado está em R$ 70 mil, totalizando R$ 38 milhões por apartamento.
Caso semelhante ocorre no empreendimento Casa Brasileira, que fica no mesmo bairro. Lá, 25% das pessoas que fecharam negócio eram de fora da cidade. O projeto foi feito numa lógica diferente da tradicional, sendo primeiro construído para depois ser vendido, resultando em um preço médio mais elevado, que é de R$ 80 mil o m² — o que deixa o preço dos apartamentos entre R$ 18 milhões e R$ 23 milhões.
“Ele se tornou um imóvel de padrão de luxo para residentes de outras regiões que não São Paulo ou até mesmo do interior do Estado. Temos clientes do Rio de Janeiro, clientes de fora (do País) e do interior de São Paulo”, afirma Lucio Junior.
Edifício Casa Brasileira, no Itaim Bibi, foi construído pela Lucio antes do início das vendas e atrai consumidores de fora de SP Foto: Divulgação/Lucio
Além de usar como base na capital paulista para ser usada quando necessário, o empresário conta que o cliente de fora de São Paulo vê o imóvel na cidade como um ativo importante no seu portfólio de investimentos, especialmente diante da oferta cada vez menor de terrenos em bairros nobres disponíveis para a incorporação imobiliária.
A empresa agora busca atingir consumidores do Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife e do interior de SP com o projeto Enora, nos Jardins. O projeto conta com a assinatura de Jader Almeida, um renomado designer de mobiliário, sendo o primeiro empreendimento que ele assina. Além disso, oferece uma área de wellness idealizada por Tânia Ginjas, que trabalhou nas áreas de bem-estar do Rosewood e do Fasano.
O empreendimento é estritamente residencial, com muitas comodidades como quadra de tênis, que foram possíveis ao abrir mão do potencial construtivo do terreno. As plantas têm de 314 a 400 m², com preço de R$ 50 mil por m².
“Esse cliente do altíssimo padrão tem o recurso, não fala da taxa de juro. Ele tem o dinheiro para comprar o apartamento e está enxergando isso como reserva de valor. Então essa questão é importantíssima. Por isso, ele começa a comprar apartamentos grandes”, afirma Renato Barbara, CEO da construtora Barbara e sócio da Lucio no Enora.
Também focada no segmento de luxo, a Marquise tem metade dos seus clientes em empreendimentos em São Paulo residentes do Nordeste, Centro-Oeste e Norte do País. Fundada há 50 anos em Fortaleza (CE), a incorporadora tem projetos imobiliários em São Paulo que atraíram investidores de fora da cidade: o já concluído Park View, na Vila Nova Conceição, e o lançamento PJM Single Living, nos Jardins. Enquanto o primeiro conta com plantas amplas de 175 m², o segundo é um projeto de compactos, com a maioria das unidades com tamanhos de 23 a 38 m².
A superintendente comercial da Marquise Incorporações, Poliana Nobre, conta que a presença da empresa em duas cidades diferentes gera procura de apartamentos por pessoas de Fortaleza na capital paulista e vice-versa. Ela diz que a grande maioria dos compradores são empresários que investem em imóveis para diversificação de portfólio em ativos com maior capacidade de valorização. Em geral, diz, esses clientes não compram para revenda rápida (flipar), mas sim para rentabilidade ou locação por temporada, e investem entre R$ 750 mil e R$ 1 milhão nos apartamentos.
Poliana afirma que, além da localização e do projeto, o investidor de fora de São Paulo se preocupa com a reputação da incorporadora. “Com isso, você tem a previsibilidade, não só que você vai receber o seu empreendimento, mas que vai receber o empreendimento com a cara das perspectivas. Não é apenas fazer imagens bonitas, mas precisamos conseguir atender a expectativa do cliente”, afirma Poliana.
Localização é prioridade para studios
Há mais de dez anos no mercado de compactos, a incorporadora One Innovation também tem 48% dos clientes oriundos de fora da capital, sendo 24% de fora do Estado. O atributo mais importante para estes compradores, segundo Petrin, é a localização. Por isso, a procura é por imóveis em bairros nobres, como Itaim Bibi, Vila Nova Conceição, Moema, Pinheiros, Perdizes e Consolação.
Empreendimento da One Innovation, na Vila Mariana, tem studios de R$ 500 mil e unidades de dois dormitórios que chegam a R$ 923 mil. Quase metade dos cliente da incorporadora são de fora de SP Foto: Divulgação/One Innovation
“São Paulo é um dos mercados mais sólidos e estratégicos do Brasil. A cidade concentra o maior polo econômico, cultural e de negócios da América Latina, o que atrai compradores que buscam segurança patrimonial e valorização”, diz o vice-presidente da empresa, Paulo Petrin.
Especializada no desenvolvimento de estúdios de 20 a 50 m², a incorporadora Next Realty tem sete empreendimentos concluídos e outros três em construção em São Paulo.
Do total das 357 unidades vendidas, 80% foram para investidores. Entre os compradores, 23% são de fora da cidade, incluindo 3% de outros países. Quando estão na cidade, os proprietários usam os imóveis e os colocam para locação de curta duração no resto do tempo. A gestão das locações é feita pela própria Next Realty.
“Os compradores brasileiros de outras cidades vêem esses imóveis compactos como um investimento. Já os expatriados buscam o imóvel para moradia. Eles estão mais habituados com este tipo de produto, que tem lavanderia coletiva e uma infraestrutura menor”, compara o CEO da Next Realty, Felipe Antunes.
Investidores internacionais
Não só investidores brasileiros têm interesse nos imóveis da cidade de São Paulo. O fundador da Altum Estate, Aleksandr Shevchenko, começou em 2022 o seu negócio voltado a conectar investidores estrangeiros a incorporadoras brasileiras. Ele conta que cerca de 90% a 95% dos clientes moram fora do Brasil e não visitam o imóvel antes da compra.
Shevchenko ressalta que o mercado imobiliário brasileiro oferece um retorno de investimento melhor do que muitos mercados globais. “Por exemplo, se uma pessoa vender um apartamento em Moscou, mandar o dinheiro para cá e comprar um imóvel em São Paulo, ele vai ganhar três vezes mais a renda de locação que ganharia em Moscou”, afirma Shevchenko.
Ele explica que isso ocorre porque em Moscou o preço de compra do metro quadrado é muito alto, mas o preço de locação é muito baixo, resultando em uma rentabilidade que pode levar 25 a 30 anos para o retorno do valor total investido na aquisição do imóvel, enquanto no Brasil a locação de curta duração pode ter rentabilidade em 8 a 9 anos.
Os estrangeiros que procuram imóveis de altíssimo padrão no Brasil por meio da Altum são de países como Rússia, Estados Unidos e Canadá. A preferência é por incorporadoras com uma longa história no mercado, fator que é visto como uma solidez que serve como garantia para o investidor estrangeiro. A empresa viabiliza vendas para mais de 20 incorporadoras, incluindo nomes como Cyrela, Benx, Eztec e Lindenberg — todas com décadas de história.
Rentabilidade
Os investimentos de brasileiros e estrangeiros no mercado imobiliário de São Paulo são sustentados pela promessa de rentabilidade, e os números mostram que essa conta pode fechar mesmo. O preço do aluguel residencial na capital paulista ficou 10% mais caro nos últimos 12 meses, segundo o Índice FipeZAP, divulgado pelo DataZAP.
“Quando compro um apartamento para investir, procuro uma rentabilidade mensal de 1,2% a 1,5% do valor do imóvel, além da valorização”, diz o investidor Pedro Ponciano, que recentemente comprou seu primeiro imóvel em São Paulo, no bairro Itaim Bibi.
Por essa conta, em menos de dez anos, o investidor pode ter o retorno do investimento feito na aquisição e passar a lucrar com a propriedade. Mas vale notar que períodos de vacância pode aumentar o tempo desse retorno.
O empresário mineiro, que é dono de cinco imóveis no País, diz que sua prioridade é investir em estúdios localizados em praias do Nordeste, especialmente em Fortaleza, mas agora enxerga a capital paulista com grande potencial por causa do turismo de negócios.
Atração de clientes
De olho no consumidor de alta renda de outras regiões do País, a incorporadora SKR tem estratégias de marketing digital e parcerias com imobiliárias regionais para atrair compradores em regiões como Porto Alegre, Salvador e Curitiba. Hoje, 25% dos clientes da empresa são de fora de São Paulo.
“Apresentamos os empreendimentos a uma imobiliária local e damos uma verba para fazer a divulgação. Além de conhecer a região, esses corretores têm uma lista qualificada de potenciais compradores”, afirma o diretor de operações (COO) da SKR, Rodrigo Putinato.
Quem faz negócios imobiliários sabe que a máxima do setor é que a localização é a premissa de qualquer imóvel. Para reduzir a desconfiança de investidores que não conhecem as localizações dos empreendimentos, existem iniciativas que levam os projetos dos prédios e entornos para qualquer lugar do País.
A Barts&Co incorporou um óculos de realidade virtual no processo de negociação. A startup se propõe a ser um estande de vendas móvel e com o uso do óculos realidade virtual, que usa imagens de alta resolução em 360 graus, Ali, é possível conhecer detalhes do imóvel, incluindo decoração, iluminação e a vista do apartamento. A tecnologia também permite que o investidor personalize algumas características da propriedade.
A estratégia da marca consiste em promover jantares com possíveis investidores ao redor do País para apresentar os lançamentos de alto padrão de incorporadoras como a Even e a Idea!Zarvos. Ao todo, a companhia tem um portfólio de mais de R$ 10 bilhões em propriedades. “Muitas vezes, o cliente ainda vai querer ir até São Paulo para conhecer o terreno, mas isso abrevia muito o processo de escolha”, afirma o CEO da empresa, Alessandro Bartelle.
Fonte ONU