‘Risco CPF’ está por trás da divisão interna do Banco Central no caso Master; leia bastidor

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BRASÍLIA – O “risco CPF” está por trás da divisão interna no Banco Central sobre o desfecho da venda de um pedaço do Banco Master para o Banco de Brasília (BRB). Enquanto a autorização da operação depende do diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução, Renato Dias Gomes, uma possível liquidação do Master – em caso de problemas de liquidez do banco – dependeria da assinatura do diretor de Fiscalização, Ailton Aquino.

Em qualquer um dos casos, os diretores encaminham um voto à diretoria colegiada, que decide por concordar ou não com o que foi proposto. Desde o início da proposta do BRB, Gomes tem se mostrado resistente à operação, segundo apurou o Estadão/Broadcast, enquanto Aquino tem dado sinais positivos. Essa batalha sobre quem decide é um dos panos de fundo da operação, já que envolve a responsabilidade de colocar o próprio CPF na aprovação de compra ou na intervenção.

Procurado, o Banco Central preferiu não se manifestar.

Se Gomes levar à cúpula do BC um desfecho no âmbito de negócios para os problemas envolvendo o Master, Aquino não precisará ter de lidar com o problema posteriormente, caso seja necessário decretar a liquidação do banco – ou resolução, como é chamada atualmente de forma técnica o processo.

Se o negócio for autorizado, mas levar a problemas ao BRB, um banco público, haverá questionamentos sobre Renato Gomes, que encaminhou o voto a favor. Se o negócio for negado, mas os problemas do Master se agravarem a ponto de chegar a um caso extremo de liquidação, aí será a área de Aquino, que cuida da fiscalização, que ficará em xeque, por não ter visto o “risco Master” crescer a tempo. Por isso, o encaminhamento do voto é visto como uma “batata quente” entre as diretorias.

Uma das preocupações no mercado financeiro é com o “risco moral” do caso Master. Há o entendimento entre analistas de que o banco teve um crescimento expressivo, num curto espaço de tempo, e baseado em um modelo de negócios extremamente arriscado.

Por um lado, o Master captava recursos oferecendo alta rentabilidade a quem emprestasse dinheiro ao banco, principalmente por meio de Certificados de Depósito Bancário (CDB) que são cobertos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Por outro, usava esses recursos para investimentos com baixa liquidez, como precatórios (dívidas que os governos são obrigados a pagar por decisões da Justiça), direitos creditórios (uma espécie de pré-precatório, porque ainda não há sentença de pagamento) e ações de empresas em dificuldades.

Essa “alavancagem” com garantias do FGC incomodou grandes bancos do País, que são os principais depositantes do fundo. Em caso de calote do Master, por exemplo, é o FGC que terá de honrar os pagamentos para investimentos de até R$ 250 mil por CPF.

Se essas operações não gerarem algum tipo de punição, há o temor de que os próprios donos do Master ou mesmo outros banqueiros avaliem que o BC pode estar sendo menos crítico e que movimentações do tipo não só continuem a ocorrer, como se alastrem pelo sistema bancário.

Decisão colegiada

No final de março, o BRB fez uma proposta para comprar um pedaço das ações do Master. Desde então, o caso está em análise pelo Banco Central, que precisa autorizar ou negar a operação. Em conversa com jornalistas na quinta-feira, 28, após uma palestra na Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio), Renato Gomes afirmou que ainda não há data para a decisão.

“Não, eu não sou a palavra final. A minha área, ela é responsável, tem o D.O.R.F., Departamento de Organização do Estado Financeiro, e essa área é responsável por analisar esse tipo de transação. Leva-se então um voto à diretoria, e é um tema de deliberação da diretoria colegiada”, respondeu Gomes. “Nós estamos trabalhando no tema, mas eu não posso te dar uma data.”

Questionado sobre rumores de uma suposta cisão em debates acerca da solução para o tema, Gomes respondeu que a diretoria da autoridade monetária trabalha de forma harmoniosa.

“Não posso relatar questões internas do Banco Central, mas eu não enfatizaria esse tema; eu acho que o Banco Central trabalha unissonamente, a diretoria é muito harmoniosa”, disse.

Outros agentes também comentaram que todos estão cientes de que se trata de uma decisão colegiada, ainda que haja mais peso para um ou outro diretor de área, o que tem sido minimizado internamente por haver a avaliação de que será uma determinação conjunta.

Como mostrou o Estadão, o Banco Master pode ser dividido em pelo menos seis partes, caso o BC aprove a venda. Além da parte para o BRB, o Master teria pedaços vendidos ao BTG Pactual, ao grupo J&F, e outros que ficariam a cargo dos antigos sócios do banco, Augusto Lima e Maurício Quadrado.

Já os ativos sem interesse do mercado permaneceriam com o banqueiro Daniel Vorcaro, dono do Master, mas com suporte do Fundo Garantidor de Créditos (FGC).

Investigação

Uma investigação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) apontou a suspeita de crimes financeiros na gestão do Banco Master, por meio de investimentos milionários fraudulentos que inflaram o patrimônio da instituição e permitiram o aporte de recursos até mesmo em empresas vinculadas à irmã do dono do banco, Daniel Vorcaro.

De acordo com a CVM, o Master investiu um total de R$ 2,1 bilhões em empresas sem capacidade econômica suficiente para dar retorno a esses investimentos. Essa situação, aponta o relatório, “pode comprometer severamente a solidez patrimonial da instituição financeira”. O Estadão teve acesso, com exclusividade, a detalhes da apuração sigilosa da CVM.

Procurado, o Master afirmou que esses investimentos “já foram integralmente quitados, não havendo qualquer exposição”.



Fonte ONU

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