
A recente decisão dos EUA de impor tarifas de até 245% sobre produtos chineses marca uma nova escalada na guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo. A justificativa oficial da Casa Branca, é conter práticas desleais de comércio, como o dumping, e proteger a indústria doméstica norte-americana. No entanto, o impacto da medida vai muito além das fronteiras americanas. A taxação, ao encarecer bens de origem chinesa, atinge diretamente as cadeias produtivas globais, uma vez que muitos desses produtos são insumos fundamentais para a produção de bens intermediários e finais em diferentes partes do mundo. Economias emergentes, exportadores de commodities e países com forte dependência de importações industriais já sentem os primeiros sinais de pressão inflacionária e instabilidade no câmbio. No Brasil, o reflexo veio com mais um dia de cautela nos mercados: o Ibovespa opera em baixa moderada, com queda de 0,29%, aos 128.870 pontos, com investidores reagindo ao aumento das tensões comerciais e aos riscos de desaceleração global.
Essas tarifas não somente afetam o comércio bilateral entre EUA e China, mas provocam efeitos que atingem consumidores e empresas de forma transversal em todo o mundo. A elevação dos preços dos insumos importados, muitos deles essenciais na cadeia produtiva industrial, encarece a produção e pressiona a inflação em países que dependem da importação desses bens intermediários. No cenário brasileiro, isso se traduz em produtos mais caros para o consumidor final, desde eletroeletrônicos até autopeças e equipamentos industriais. A consequência imediata é o aumento dos custos operacionais e a redução das margens de lucro, o que pode gerar repasses de preços ao consumidor e acirrar a já delicada inflação interna.
Conforme alerta João Kepler, CEO da Equity Group, “essa não é uma briga isolada, é uma disputa que chega até o consumidor final em forma de preços mais altos, tanto nos EUA quanto em países que importam bens intermediários. O protecionismo traz um custo que poucos estão dispostos a calcular”.
O impacto direto sobre a economia dos EUA, por enquanto, ainda não se mostra de forma dramática nos indicadores de consumo. Os dados divulgados recentemente sobre o varejo em março surpreenderam positivamente, com uma alta de 1,4%, acima do esperado pelo mercado. O núcleo, que exclui itens voláteis como alimentos e combustíveis, avançou 0,5%, sinalizando alguma desaceleração, mas ainda dentro de um contexto de resiliência. O mercado de trabalho continua forte, o que sustenta, por ora, o consumo interno. Entretanto, Kepler alerta que essa força pode ser passageira, já que a inflação pressionada por tarifas mais altas tende a corroer o poder de compra, especialmente em setores mais sensíveis a variações de preços.

Além disso, o ambiente global fica mais instável. A medida protecionista adotada pelos EUA amplia a aversão ao risco entre investidores internacionais, levando à valorização do dólar no curto prazo e à fuga de capitais de mercados emergentes. Essa combinação aumenta a volatilidade cambial e torna o cenário mais desafiador para países como o Brasil, que dependem de equilíbrio externo para atrair investimentos e conter pressões inflacionárias. A incerteza também dificulta as projeções de crescimento para a economia global, na medida em que o comércio internacional tende a desacelerar com a alta generalizada de custos logísticos e produtivos.
“O risco de contágio econômico, portanto, não deve ser subestimado, pois compromete tanto grandes economias exportadoras quanto pequenas economias importadoras”, finaliza Kepler.
Fonte Monitor Mercantil